segunda-feira, 7 de outubro de 2019

Por que todo homem se acha no direito de comentar a aparência de uma mulher?

O presidente da República Jair Bolsonaro e o ministro da Economia Paulo Guedes não estão sozinhos. Comentários sexistas como os feitos pelos dois sobre a aparência e a idade de Brigitte Macron são mais comuns do que se pensa. Segundo psicólogas e psicanalistas, esse tipo de ofensa é algo como um ritual de afirmação de masculinidade. Freud explica.


Guedes comentou a aparência física de Brigitte Macron para uma plateia de empresários em Fortaleza. Foi aplaudido, como mostra vídeo. Depois dos comentários ofensivos, o ministro da Economia se desculpou. Disse que foi “brincadeira”. Freud também explica.

Em tempos de quarta onda feminista, o resultado de comentários sexistas não seria diferente: choque e, no caso das ofensas à primeira-dama da França, um pedido de desculpa espontâneo, feito por milhares de brasileiros no movimento #DesculpaBrigite, que virou treding topic no Twitter.

Mas, afinal, por que os homens se acham no direito de comentar a aparência de uma mulher e até ofendê-la? Celina convidou quatro psicanalistas a explicarem esse comportamento, que, infelizmente, se repetiu no alto escalão.

Para Barbara Meneses, psicóloga e sexóloga, a questão é cultural e é a expressão mais clara do machismo:

—  É uma cobrança muito forte por um padrão, uma perfeição. A questão da aparência feminina pesa muito. O homem se sente no direito de comentar sobre isso justamente porque ele ainda se sente superior — declara. — Esses padrões fazem sofrer. É uma violência contra a mulher. A repercussão é muito séria, as pessoas morrem por isso. Acham que se não alcançam um padrão, o jeito que você é não é suficiente. 

Barbara afirma que mesmo quando os homens não estão dentro dos padrões de beleza, eles se sentem no direito de falar sobre as mulheres:

— Se fosse uma pessoa muito linda, ainda seria errado, mas desse jeito só piora. Eu acho inconcebível uma declaração dessas na posição deles. É falta de responsabilidade porque saber que esse tipo de coisa é falada no cotidiano é uma coisa, mas vir do presidente da República e de um ministro de Estado é muito sério. Eles são exemplos para as pessoas, e esses comentários representam o que a nossa sociedade tenta acabar.

A psicanalista e autora Regina Navarro Lins reforça a visão de Bárbara sobre o julgamento da aparência estar ligado ao sistema patriarcal. No entanto, ela complementa que os próprios homens estão começando a sofrer com o sistema que sustentam:

— Um paciente meu de 26 anos chegou ao meu consultório querendo se suicidar porque tinha broxado três vezes. Ele pode não saber, mas pensar em se matar por esse motivo está relacionado à imagem que a sociedade patriarcal exige do homem: forte, corajoso, sem fragilidade e provedor — explica Regina, ressaltando como isso afeta as relações. — Já vi casos de um cara não namorar uma menina legal com medo de se achar inferior ao amigo que namora uma gostosa. Ou então se afastar do amigo. Essa mentalidade gera sofrimento.

Fonte: O Globo