Nas
eleições municipais de 2016, 14.417 das 158.453 25 mulheres que disputaram um
cargo público não obtiveram nenhum voto, cerca de 9% do total, de acordo com o
TSE (Tribunal Superior Eleitoral). São as chamadas "candidaturas-laranja",
apenas para preencher a cota de pelo menos 30% de candidaturas de cada um dos
gêneros por partido, prevista na Lei das Eleições.
Para
combater o problema neste ano, o Ministério Público Eleitoral de São Paulo quer
fazer um acompanhamento durante o período de campanha. "Nas eleições
anteriores, a gente só verificou que a candidata não tinha doações e não tinha
feito nenhum gasto, no final. Nessa eleição, a proposta é fazer o
acompanhamento concomitante", o procurador regional eleitoral em São Paulo
Luiz Carlos dos Santos Gonçalves.
Os
candidatos são obrigados a detalhar as doações recebidas a cada 72 horas. De
acordo com Gonçalves, não constar qualquer doação à campanha da candidata, nem
haver panfletos ou participação nas mídias sociais são indícios de uma
candidatura fantasma. Neste caso, o MP pode notificar o partido, conversar com
a candidata e instaurar um procedimento de acompanhamento do caso.
Apesar
de a intenção da lei de cotas ser a ampliação da representatividade da mulher
na política, na prática, ela tem sido violada pelas legendas.
"Infelizmente, o que a gente observa em muitos casos é que a mulher
empresta o nome para compor a chapa do partido, mas desde o início não faz
campanha nenhuma. Não é que ela não teve apoiamentos, não teve votos porque os
eleitores a consideraram uma má candidata. É porque ela não foi atrás dos
eleitores", afirma o procurador.
De acordo com o jurista,
trata-se de casos de abuso de poder. "Quando o partido usa esse expediente
é sempre o abuso de poder das lideranças oligárquicas de um partido. Gente que
não confia, não acredita na igualdade da mulher na política."
Justiça
pode cassar mandatos
Se for comprovada ilegalidade, a Justiça pode considerar que a chapa foi registrada irregularmente por não cumprir a cota e, portanto, os mandatos dos candidatos eleitos devem ser cassados.
Foi o que decidiu, por exemplo, o Tribunal Regional Eleitoral de São Paulo no caso dos vereadores Carlos Fernando Stafoge, Mário Henrique Parreira Simões de Souza, Celso dos Santos e Luiz Carlos Fajioli, de Cafelândia (SP).
O tribunal entendeu que o baixo número de votos das candidatas inscritas pelas legendas da coligação, no caso, PR e PTB, nas eleições de 2016, e a falta de doações a elas eram indícios do uso de laranjas apenas para cumprir a cota. Apenas duas das 6 mulheres inscritas pela coligação tiveram votos.
Relator do caso no TSE, o ministro Admar Gonzaga, contudo, concedeu liminar para que os vereadores retomassem os mandatos. Ele entendeu que não havia provas de que a cota feminina dos partidos foi fraudada. "Entendo no mínimo controversa a tese encampada pela Corte Regional de que as candidaturas registradas voluntariamente pelas candidatas, as quais em princípio não foram vítimas de nenhum engodo, com o intuito deliberado de 'ajudar o partido' e que tenham alcançado baixo desempenho eleitoral se enquadrem no conceito de fraude apurável em sede de ação de investigação judicial eleitoral", disse o ministro.
O procurador do MP Eleitoral de São Paulo rebateu. "O processo nunca é decidido com base numa tese, por mais simpatia que nós tenhamos por essa tese, como a igualdade da mulher na política. O exame do processo sempre é feito com base nas provas. Ao ver do Ministério Público de São Paulo, ficou comprovada a fraude nas candidaturas femininas", afirmou Gonçalves. De acordo com ele, em casos de dúvidas, o MP recomenda a permanência dos parlamentares nos cargos.
Fundo Eleitoral para mulheres
Nestas eleições, 30% dos recursos de cada partido vindos do Fundo Eleitoral — com R$ 1,7 bilhão — terão de ser destinados a campanhas de mulheres. A verba inclui candidaturas majoritárias e proporcionais e, quando o partido não lançar nomes para determinados cargos, a divisão ficará entre os demais cargos.
Por exemplo, no caso do PCdoB e da Rede, que têm como pré-candidatas à presidência Manuela D’Ávila e Marina Silva, respectivamente, os 30% serão repartidos entre elas e candidatas a senadoras, deputadas federais e governadoras.
Essa
divisão caberá à comissão executiva nacional de cada sigla, após consulta às
candidatas. Já a fiscalização caberá ao MP eleitoral de cada estado. No próximo
dia 26, a Procuradoria Regional Eleitoral de São Paulo fará uma reunião com
representantes das comissões femininas dos partidos e pré-candidatas para
discutir como será esse acompanhamento.
"Tem partidos com comissões de mulheres muito fortes e elas mesmo já disseram que vão fiscalizar cada centavo. Ao passo que tem partidos em que as mulheres são menos estruturadas, organizadas. Para esse tipo de situação, o apoio da sociedade civil, do Ministério Público, é mais importante", afirmou Gonçalves.
O procurador defende a cota de 30% decidida pelo TSE para o Fundo Eleitoral. "Não sou contra dar dinheiro para os partidos. A política tem um custo. Mas você dar quase R$ 2 bilhões, em um sistema em que há essa discriminação odiosa contra mulheres e você deixa os partidos investirem esse dinheiro para manter essa discriminação, isso a Constituição não protege", afirmou.
O Brasil ocupa a 115ª posição no ranking mundial de presença feminina no Parlamento entre os 138 países analisados pelo Projeto Mulheres Inspiradoras (PMI), com base no banco de dados primários do Banco Mundial e do TSE.
De acordo com o Ranking de Presença Feminina no Parlamento 2017, o Brasil deve atingir igualdade de gênero no Parlamento Federal só em 2080.
Em 2014, 10% das cadeiras na Câmara dos Deputados foram para deputadas. No Senado, o percentual foi de 18%. As deputadas estaduais, por sua vez, somaram 11%. No Executivo, havia apenas uma mulher eleita entre os governadores. Já nas eleições municipais de 2016, as cadeiras femininas representaram 13,5% das vereadoras e 12% das prefeitas.
Fonte: Huffpost Brasil