A
Organização das Nações Unidas (ONU) divulgou na noite da última quarta-feira
(11) o comunicado enviado ao governo brasileiros em que manifesta preocupação
com o Projeto de Lei 6299/02, que sugere uma série de mudanças na atual Lei dos
Agrotóxicos, batizado por ativistas e críticos de “Pacote do Veneno”.
Na carta
enviada em junho, relatores das Nações Unidas alertam que as mudanças, caso
sejam aprovadas, podem violar direitos humanos de trabalhadores rurais,
comunidades locais e consumidores de alimentos produzidos com ajuda de
agrotóxicos.
"As mudanças podem enfraquecer significativamente os critérios para aprovação do uso experimental e comercial de pesticidas, representando uma ameaça a uma série de direitos humanos", disseram os especialistas no relatório enviado ao chanceler brasileiro, Aloysio Nunes Ferreira, e ao presidente da Câmara, Rodrigo Maia.
Relatores apontam que o PL torna mais flexível uma série de regras para o uso e registro de produtos tóxicos no País -- o que poderia enfraquecer a regulação e o controle de produtos perigosos, além de aumentar seu consumo no Brasil e no mundo, já que o Brasil é um grande exportador de alimentos.
A carta ainda cita dados do Ministério da Saúde. Apenas no ano de 2017 foram registrados 5.501 casos de intoxicação com agrotóxicos, o que representa uma média de 15 pessoas intoxicadas por dia. O número é quase o dobre do registrado 10 anos atrás. Destes casos, 150 pessoas morreram no Brasil como resultado do envenenamento apenas no ano passado. A carta complementa:
A ONU também lembrou que cinco dos 10 pesticidas mais vendidos no Brasil (são eles: Atrazina, Acefato, Carbendazim, Paraquat, Imidacloprida) não são autorizados em diversos outros países devido a seus riscos à saúde humana ou ecossistemas.
"Enquanto a União Europeia limita em 0,1 miligrama por litro a quantidade máxima de glifosfato a ser encontrada na água potável, o Brasil permite 5 mil vezes mais, de acordo com dados da academia brasileira", ressaltou o texto publicado ontem.
Aprovação de pesticidas pelo Ministério da Agricultura
Um dos pontos criticados no projeto, a ONU alertou sobre o perigo de concentrar a fiscalização e aprovação de novos produtos no Ministério da Agricultura. Atualmente, a aprovação e o registro requerem o aval das autoridades federais de saúde, meio ambiente e agricultura: Anvisa (Agência Nacional de Vigilância Sanitária), Ibama (Instituto Brasileiro do Meio Ambiente e dos Recursos Naturais Renováveis) e Ministério da Agricultura.
O texto retira essa atribuição da Anvisa e do Ibama, que apenas poderiam dar "apoio técnico" ao Ministério da Agricultura.
"As
preocupações se referem ao fato de que as enormes capacidades financeiras do
lobby da agricultura no Brasil poderiam facilmente controlar as decisões
adotadas com este novo arranjo institucional", disseram os especialistas
da ONU.
"O uso de agrotóxicos afeta não somente a agricultura, mas traz claros riscos para a saúde humana e para o meio ambiente, devendo a competência de avaliação dos riscos provocados nessas áreas ser exercida pelos órgão correlatos", criticou a Anvisa em nota publicada em junho deste ano. A agência ainda afirma que o projeto desvaloriza e desmonta todo o trabalho da agência e do PARA (Programa de Análise de Resíduos de Agrotóxicos em Alimentos) que avaliam continuamente os níveis de resíduos de agrotóxicos nos alimentos consumidos pela população, inclusive coletando alimentos nas redes atacadistas e varejistas -- trabalho que não é feito pelo Ministério da Agricultura.
O Ibama
também enviou ao Ministério do Ambiente no final de abril uma nota técnica afirmando
que as mudanças propostas são "inviáveis ou desprovidas de adequada
fundamentação técnica e, até mesmo, contrariam determinação
Constitucional".
Sentido oposto do mundo
Os especialistas da ONU alertaram que, apesar de diversos países incentivarem e investirem cada vez mais na agricultura orgânica, o Brasil continua estimulando o uso de agrotóxicos por meio de incentivos fiscais.
O decreto 7.660 de dezembro de 2011, exemplifica a carta, estabeleceu total de isenção fiscal para produtos industrializados para a produção e venda de pesticidas, e o acordo 100/97 do Conselho Nacional de Política Fazendária (Confaz) reduz em 60% a base usada para calcular impostos sobre a circulação de bens e serviços para produtos utilizados na agricultura, como o agrotóxico.
A Comissão Especial na Câmara aprovou o PL no dia 25 de junho, em meio à Copa e a portas fechadas. Ele segue agora para ser apreciado pelo plenário da Câmara, ainda sem data para a votação.
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