Concentração,
infelizmente, é palavra chave quando falamos de comunicação no Brasil. Além da
radiodifusão, quando o assunto são telecomunicações e acesso à Internet o
cenário é ainda mais concentrado em poucas empresas.
Atualmente, quase
95% do acesso à banda larga fixa e da telefonia fixa, e mais de 80% da
telefonia móvel são controlados por três companhias. Para a oferta do serviço
de acesso à Internet, a consequência dessa concentração é desastrosa.
Segundo a última pesquisa TIC Domicílios, publicada pelo Comitê Gestor da Internet no Brasil (CGI.br), 27% da população brasileira não tem acesso à rede. Norte e Nordeste são as regiões mais desfavorecidas, com 36% de pessoas desconectadas. Lá, mesmo nos grandes centros urbanos, as populações que residem nas periferias não têm acesso pela rede fixa, ficando sujeitas à conexão móvel, bastante restrita e limitada.
Contrapor esse abismo requer a adoção de políticas públicas e uma melhor regulação da oferta dos serviços pelas operadoras. Importante lembrar que o Marco Civil da Internet (lei 12.965/2014) já estabelece o acesso à rede como um serviço essencial para o exercício da cidadania, que deve, portanto, estar acessível a todos. Porém, uma internet livre, aberta e plural, disponível a todos/as, está longe da realidade.
O problema piora quando vemos que poucos candidatos à Presidência da República enfrentam essa questão, tão essencial para o desenvolvimento econômico, social e cultural da nossa sociedade, nessas eleições.
Dos 13 candidatos que disputam a vaga para a Presidência, cinco trazem menções superficiais ao tema telecomunicações e Internet: Jair Bolsonaro (PSL), Ciro Gomes (PDT), Marina Silva (Rede), José Maria Eymael (PSDC) e João Goulart Filho (PPL).
Bolsonaro se coloca como um defensor da liberdade de Internet e diz ser contra qualquer regulação ou controle social da mídia, sem dar maiores detalhes. Se eleita, Marina Silva promete um governo aberto e digital, pautado pela participação, transparência e pelo uso das novas tecnologias de informação e comunicação na busca de serviços públicos mais eficientes e de melhor qualidade. Promete ainda o uso de tecnologias como big data, blockchain e inteligência artificial pela gestão pública. Mas não diz como fará isso ser realidade para o conjunto da população.
Ciro Gomes, José Maria Eymael e João Goulart Filho falam em acesso de banda larga para todos. Ciro destaca a implementação de objetivos e estratégias da Política Nacional de Inclusão Digital, com vistas a promover a infraestrutura para acesso à Internet. “Integração e modernização dos sistemas públicos de Tecnologia da Informação e de Comunicação (TIC) e implementação de sistemas de big data no Governo Federal”, diz ainda o programa do candidato do PDT. Eymael limita o acesso ao plano escolar. João Goulart Filho promete reativar a Telebrás e sugere a criação de uma secretaria especial para as culturas digitais.
Geraldo Alckmin (PSDB), João Amôedo (Novo), Álvaro Dias (Podemos), Henrique Meirelles (MDB), Cabo Darciolo (Patriota) e Vera Lúcia (PSTU) sequer mencionam políticas de comunicação em seus projetos. Assim como mostrou o último artigo deste blog, são as candidaturas Fernando Haddad (PT) e Guilherme Boulos (PSOL) que também trazem propostas específicas para universalizar o acesso à Internet e melhorar a qualidade do serviço ofertado.
PT diz que investirá em banda larga barata e acessível
A candidatura do Partido dos Trabalhadores se compromete a investir fortemente para “garantir a universalização da banda larga barata e acessível para todos e todas, com a universalização do serviço de acesso à Internet fixa e diminuição do preço da Internet no celular”. Segundo o programa, hoje, o direito humano à comunicação está violado e o acesso à Internet em alta velocidade está condicionado à renda dos cidadãos, ampliando o fosso entre pobres e ricos no acesso a direitos e serviços.
A candidatura Haddad fala ainda em atenção especial à implementação da nova “Lei de Proteção de Dados Pessoais, inclusive à efetiva implantação da autoridade nela prevista e à consolidação prática do Marco Civil da Internet enquanto fundamento legal da jurisdição brasileira sobre as atividades na Internet em território nacional, sendo assegurada a neutralidade da rede”. O programa também fala em fomento a pesquisas e investimentos em inovação que ampliem a presença de empreendedores brasileiros na Internet.
PSOL fala em universalização e infraestrutura
Em seu programa, o Partido Socialismo e Liberdade critica os governos petistas pela perda da “oportunidade de avançar na democratização da comunicação” e pela não alteração, dentro da Agência Nacional de Telecomunicações (Anatel), “na lógica de favorecimento do setor privado”.
Diz que não foi estabelecida uma “política pública robusta para a garantia da universalização do acesso à Internet, nem mesmo para a sua garantia em instituições públicas de todo o país, como escolas e postos de saúde”. “A insuficiência do PNBL (Plano Nacional de Banda Larga) fez a lógica do mercado prevalecer – e, na lógica do mercado, a opção foi aumentar as conexões móveis, que consistem em um acesso precário à rede”, acredita o partido.
O programa de Guilherme Boulos traz nove itens/propostas para o que chama de uma internet “mais justa, gratuita, mais segura, democrática e pública, que impulsione a economia e torne o Estado mais eficiente e mais democrático”.
Entre os itens, estão: fortalecer a Telebrás e retomar o controle da infraestrutura pública; garantir o acesso à Internet a todas as escolas, bibliotecas, órgãos e postos de saúde, transformando-os em pontos de cultura digital; impedir que os recursos do FUST (Fundo de Universalização dos Serviços de Telecomunicações) sejam usados para o superávit primário, aplicando em políticas públicas inovadoras; e incentivar o uso do software livre e a cultura não corporativa de direitos sobre informação.
Ainda sobre a Internet, uma proposta do PSOL sugere que o Estado tenha uma regulação mais eficiente do setor, “que leve as operadoras a praticar preços mais acessíveis, tarifas sociais e serviços de melhor qualidade, enquanto preparamos a estrutura para Internet Banda Larga grátis em todo o Brasil”.
O programa de Boulos aborda ainda assuntos importantes na área da comunicação, como a privacidade e liberdade de expressão na rede, sugerindo a não mercantilização e vigilância de dados pessoais, e a exigência de mecanismos claros e transparentes para a remoção de conteúdos ilícitos das redes.
O fato é que o Brasil tem o desafio de universalizar o acesso à Internet, superando vilões como o preço e a concentração da oferta do serviço. Enquanto não forem vencidos, a inclusão digital seguirá restrita a quem tem renda para pagar por aquilo que deveria ser visto como um direito. Infelizmente, a depender do resultado eleitoral, este seguirá sendo mais um problema que divide ricos e pobres no país.
*Camila Moreira é jornalista, formada pela Universidade Federal do Pará. Já atuou em assessorias de comunicação de órgãos públicos e empresas privadas, além de jornais como repórter e editora.
Fonte: Carta Capital